25/07/11

Abre-se a onda do poema

Na verdade, é numa espécie de entre-dois, a meio caminho entre a inteligência de um sentido e a sensibilidade às formas verbais, onde se dá a hesitação entre sentido e som, que se abre a onda do poema. Ao solicitar, mais do que a nossa inteligência narrativa, uma compreensão que se poderá dizer "afectiva", o poema lança as suas palavras como outras tantas sondas, em direcção aos fundamentos mais recônditos da nossa presença sensível no mundo. Ele faz vibrar em nós a corda enigmática do tempo, isso mesmo em que se mostra mais inescrutável. E o poema excita também as nervuras mais secretas da nossa habitação corporal e espacial do mundo. Desta forma, não é uma mensagem que ele passa, nem o que quer que seja que possa ser da ordem de um ensinamento doutrinário. Ele não põe ideias em verso; desenha e declina versões de mundos que são outros  tantos esboços de uma outra economia possível da existência - de um outro ethos (morada); o qual seria, no dizer de Mallarmé, mais "autêntico".

Jean-Claude Pinson, in Para Que Serve a Poesia Hoje, ed. Deriva

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