13/01/10

Mad Men

Há um filão que parece não se esgotar na produção televisiva americana - e a única maneira que temos de beneficiar desta época de ouro é ver as séries, tarde e a más horas, em canais por cabo ou em DVD. Não vale a pena lamentar os enchidos de novelas ao serão em vez de produtos acima de qualquer suspeita; na cabeça dos programadores das televisões nacionais o lucro é sinónimo de oferecer ao povo aquilo que este pensa que quer - velha história. A verdade é que estas séries passam nos E.UA. em prime time, sendo sinónimo de audiência garantida para os canais nacionais americanos - e falamos "apenas" de House, Perdidos ou Flashforward, por exemplo. Não lamentemos, então, e saboreemos em doses mais ou menos homeopáticas o que vai sendo importado.
A RTP 2, lembrando-se de que também tem uma função de serviço público, vai passando diariamente, depois do seu serviço noticioso, uma amostra desta produção. Actualmente, destaca-se Mad Men, às sextas-feiras. A série retrata as vidas de um conjunto de publicitários americanos na transição dos anos 50 para os 60. Os optimistas 50 terminavam, os revoltosos 60 começavam, e tudo estava prestes a mudar. O que é extraordinário é o ponto de partida da série: a estrutura folhetinesca, que por vezes até faz lembrar uma qualquer novela, é de uma simplicidade aparente: os diálogos são inteligentes, a fotografia e os cenários exemplares, reconstituindo a época de acordo com a imagem que temos dela (a imagem criada, é certo) e o trabalho de câmara tem quase sempre uma qualidade cinematográfica - como alguém já escreveu algures, Mad Men é melhor do que 90% dos filmes que são produzidos nos E.U.A. Está lá tudo: os hábitos que agora são considerados politicamente incorrectos - fumar, bater nos filhos, sujar os espaços públicos; o lugar da mulher na sociedade, muito distante do que entretanto já foi conquistado; os conflitos raciais; o aparecimento de uma nova classe burguesa, que precede em duas décadas o predomínio dos yuppies.
Precisamos de conhecer o passado para entender e aceitar o presente. Em apenas quarenta anos, o mundo ficou completamente diferente; os valores não são perenes, como já devia saber quem luta contra a mudança, principalmente quando a mudança pode levar a mais igualdade e justiça. Mad Men é a série ideal para se perceber esta ideia.

(Texto publicado originalmente no Arrastão)

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