28/09/08

Wall-E (2)


A técnica, de filme para filme, aprimora-se. Tem sido assim com a Pixar, desde Toy Story. Felizmente, cinema não é só técnica, e a atenção que o guião dos filmes de animação digital tem tido é o que tem permitido a estes filmes serem mais do que estéril fogo-de-artifício. A concorrência da Dreamworks também tem sido essencial - de filme para filme, a Pixar sente a obrigação de provar que ainda é melhor; daí, a sequência que tem sido prosseguida em contexto de escalada de qualidade: Toy Story - À Procura de Nemo - Wall-E; com Monstros pelo meio. Os dois últimos da cadeia são obra de Andrew Stanton, o que diz muito sobre o seu contributo para um género que começou com Walt Disney (a referência, é claro, não incorre em qualquer displicência ou exagero). 

Wall-E, por tudo e mais alguma coisa, deverá ter atingido um ponto difícil de superar por quem se segue. O segredo, parece-me, é o filme ter sido feito com todos os meios digitais disponíveis, e simultaneamente passar uma mensagem retro a quem se sente ultrapassado pelas novas gerações. É um filme digital com um espírito analógico; e vamos ser optimistas: não há qualquer contradição ou cinismo nas intenções de Stanton, ele é tão romântico como o tradicionalista Miyazaki. Não é novidade, Carros já tinha ensaiado esta aproximação metaficcional; mais é mais eficaz do que nunca, como se a velocidade do tempo presente fosse bruscamente desacelerada por um travão divino.

E falamos de lentidão, do seu elogio, de coisas antigas e do fétichismo que as envolve. Desde o robô Wall-E, modelo ultrapassado, ternurosamente ferrugento, até à revolta dos robôs high-tech defeituosos - a diferença como elemento de progresso -, passando pelas imagens analógicas de Hello, Dolly digitalmente manipuladas por um gadget do robô, o coração do filme é uma homenagem às coisas antigas, ultrapassadas, a um modo de vida em vias de extinção, a caminho da ruína. Que tudo isto seja mostrado recorrendo a tecnologias de animação avançadas é uma ironia que enriquece ainda mais o filme.

(continua)

[Sérgio Lavos]

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